Diante do pior ano epidemiólogico de arboviroses que Minas vem enfrentando, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) está em plena força-tarefa para qualificação de profissionais, com objetivo de agilizar e melhorar a assistência em todas as regiões.
É consenso que o diagnóstico precoce e o tratamento oportuno e específico evitam complicações e óbitos de dengue e de chikungunya.
Entre as ações, a SES-MG está promovendo capacitações sobre o manejo clínico e enfrentamento das arboviroses (dengue, chikungunya, zika e febre amarela), para médicos e enfermeiros que atuam diretamente na assistência dos casos.
A iniciativa conta ainda com o envolvimento de gestores municipais de saúde, coordenadores de vigilância, assistência e comunicação.
Por meio das Unidades Regionais de Saúde e da equipe técnica do Nível Central, a SES-MG está percorrendo as 16 macrorregiões de saúde de Minas Gerais com a capacitação “Qualificação em Arboviroses: Manejo Clínico e Planos de Contingência”.
O objetivo da ação é melhorar a assistência ao usuário no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e controlar o aumento de casos e de óbitos evitáveis em decorrência de dengue e chikungunya.
Na qualificação do manejo clínico das arboviroses são trabalhados os sinais e sintomas das doenças, monitoramento laboratorial, classificação de risco, sinais de alarme a serem identificados em pacientes com dengue e o protocolo para tratamento oportuno dos pacientes com base em evidências científicas.
Na programação, voltada a gestores, também é abordado o Plano de Contingência para o enfrentamento das arboviroses. Por meio desse instrumento, é possível identificar os riscos potenciais, definir ações para mitigar esses riscos e estabelecer e organizar respostas coordenadas e articuladas entre as esferas de governos, em tempo oportuno, gerando respostas rápidas e efetivas no controle e prevenção das principais doenças causadas por arbovírus.
Calendário
A ação já foi realizada em 14 macrorregiões de saúde, com abrangência de 679 municípios.
A qualificação dos profissionais teve início em 30/1 com a macrorregião Centro (Belo Horizonte, Sete Lagoas e Itabira) e será finalizada nos dias 25 e 26/3 nas macrorregiões Sudeste (Juiz de Fora, Leopoldina e Ubá) e Leste do Sul (Manhuaçu e Ponte Nova).
“As ações de qualificação do manejo clínico em arboviroses e os Planos de Contingência são uma oportunidade para atualizar os profissionais a respeito das orientações técnicas com o objetivo de organizar a rede e os fluxos na porta de entrada nos serviços de urgência e emergência, de forma que se faça a triagem de todos os pacientes nessas unidades, e que haja priorização no atendimento dos casos suspeitos de dengue, chikungunya e zika”, explica Jaqueline Oliveira, superintendente de Vigilância Epidemiológica da SES-MG .
“Também são disponibilizadas diretrizes sobre a testagem dos pacientes com suspeita de arboviroses, manejo integrado de vetores, notificação e investigação dos casos suspeitos, buscando qualificar as informações sobre a ocorrência dessas doenças e orientar as ações de tratamento e acompanhamento dos pacientes na rede”, complementa.
Desafios
Para o médico Tiago Deus Cunha, que atua na Atenção Primária, em Patos de Minas, a principal dificuldade na assistência aos pacientes com dengue tem sido o grande volume de atendimentos diários e por isso é essencial que o fluxo seja mais efetivo.
“Temos enfrentado uma grande demanda de casos de dengue desde o começo do ano, tanto nos postos de saúde quanto na UPA e no recém-aberto Centro de Enfrentamento contra a Dengue. Então essa capacitação é fundamental, pois nos apresenta a melhor maneira de manejar esses pacientes, evitando a evolução para sintomas mais graves, bem como internações e hospitalizações”, avalia.
Em Muzambinho, Ana Paula Araújo dos Reis, enfermeira do pronto atendimento da Santa Casa, conta que o aumento expressivo do número de casos suspeitos de dengue também está sendo um desafio para a assistência local.
“Nesses últimos meses, estamos atendendo um número elevado de casos suspeitos de dengue, e está sendo um desafio para nós que acabamos de sair de uma pandemia de covid”, pontua.
Ela destaca o trabalho no acolhimento e avaliação dos pacientes. “Como enfermeiros, somos responsáveis por avaliar esses pacientes na porta de entrada das unidades, identificando os sinais de alarme e conduzindo o fluxo de atendimento da melhor forma possível, como a hidratação necessária, além do acompanhamento. Então, o treinamento é de extrema importância para realizarmos o manejo correto dos pacientes”, ressalta. “Além disso, vamos transbordar esse conhecimento para toda a equipe que atua diante dos casos de dengue”, acrescenta.
Diagnóstico diferencial
Os principais sinais relacionados à dengue são o início súbito de febre, acompanhado de mal-estar, dor no corpo, dor nas articulações e dor atrás dos olhos. Já em relação à chikungunya, os sintomas, principalmente no início da doença, são muito semelhantes, como a febre alta e dor no corpo (às vezes de menor intensidade), associados à dor nas articulações. Além disso, é comum o aparecimento de conjuntivite em pacientes com chikungunya.
A médica do Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (Cievs Minas), Natali Nicolino, afirma que os sintomas da dengue e da chikungunya costumam ser muito parecidos. Por isso, ela recomenda que as pessoas procurem uma Unidade Básica de Saúde (UBS) logo que aparecerem os primeiros sintomas.
“A diferenciação das doenças deve ser realizada por um profissional médico, após consulta diagnóstica, para que a pessoa receba o tratamento característico para a condição”, afirma.
A dengue é uma doença febril aguda e que se manifesta de forma sistêmica, podendo causar sintomas em todo o corpo. Ela também se comporta de maneira dinâmica, ou seja, a evolução do caso pode ser muito rápida. Por isso, é necessária atenção com os sinais de alerta.
A infectologista afirma que os sinais de alarme podem se manifestar como dores abdominais e vômitos persistentes, queda na pressão (identificada como desmaios), sonolência e dificuldade de hidratação. “Nesses casos, é necessário que essa pessoa se dirija imediatamente às unidades de saúde para serem tratadas de forma adequada e oportuna, porque a evolução para o possível choque é muito rápida”, recomenda.
A fase febril dura em torno de três a cinco dias do início. Após o desaparecimento da febre, podem ocorrer dois processos: a doença pode evoluir de forma favorável ou entrar em uma fase crítica. A fase crítica aparece após o desaparecimento da febre e é acompanhada dos sinais de alarme.
“No entanto, se a febre recua e não aparecem os sinais de alarme, significa que a pessoa teve uma evolução favorável. Durante os próximos dez a 15 dias, pode permanecer uma leve dor no corpo que vai melhorando”, explica Natali Nicolino.
Já a evolução da chikungunya é diferente. A fase febril possui um curso mais curto, ocorrendo durante dois a três dias. Após a resolução do período febril, no entanto, ocorre a persistência ou surgimento das dores articulares acompanhadas por vermelhidão e inchaço das articulações e por dores fortes que podem permanecer por mais de sete dias.
Caso as dores permaneçam por mais de 14 dias, a chikungunya entrou na fase subaguda, podendo permanecer por mais de 30 dias, caracterizando, assim, a fase crônica da doença, que pode durar cerca de seis meses até sua resolução completa.
Tratamento
O principal tratamento para a dengue e chikungunya é a hidratação correta por via oral ou venosa. Para aliviar os sintomas, é necessária a prescrição de analgésicos e antitérmicos. Nas unidades de saúde, os pacientes recebem orientação sobre a hidratação balanceada e sobre o uso das medicações necessárias.
“O tratamento deve ser dividido em uma parte de ingestão de água e líquidos e outra de ingestão de sais de hidratação. Essa orientação é para dengue e chikungunya, uma vez que no início não é possível diferenciar as duas doenças”, salienta Natali Nicolino.
Cenário epidemiológico
O ano de 2024 já pode ser considerado como o pior ano epidêmico da história de Minas Gerais. Até 18/3, foram notificados 629.268 casos prováveis de dengue. Ao longo de todo o ano de 2016, até então a maior epidemia da doença, foram notificados 521.048 casos prováveis.
Apesar do elevado número de notificações, a letalidade da doença é baixa quando comparada a outros anos epidêmicos. Até o momento, foram confirmados, em 2024, cem óbitos por dengue, em um total de 3.967 casos graves ou com sinais de alarme, o que representa uma taxa de letalidade de 2,52%, muito abaixo da taxa então registrada nas semanas epidemiológicas de 1 a 11 nos anos anteriores de epidemia de dengue no estado (2010, 2013, 2016, 2019 e 2023). Além disso, a letalidade atual também é inferior à taxa nacional.
O cálculo da letalidade da dengue é realizado a partir dos casos que são classificados como casos de dengue grave ou com sinais de alarme que evoluem para óbito. Dessa forma, para o cálculo de letalidade por dengue, considera-se o número de óbitos confirmados, dividindo-o pelo total de casos de dengue grave ou com sinais de alarme, multiplicando o resultado por cem.
SES-MG / Divulgação
De acordo com o subsecretário de Vigilância em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, Eduardo Prosdocimi, a organização da rede de assistência à saúde adotada no estado, com leitos exclusivos para a dengue, está fazendo diferença na letalidade da doença.
Além disso, ele afirma que a organização do fluxo de atendimento, a implementação do plano de contingência bem executado e a capacitação dos profissionais no interior de Minas também têm contribuído para manter a letalidade da doença abaixo do esperado.
“Minas Gerais está enfrentando o pior ano de sua história com altas taxas de notificação de casos de dengue. Porém, com o fortalecimento da rede e a capacitação dos profissionais para atender com efetividade os casos de arboviroses no estado, estamos conseguindo oferecer um tratamento de qualidade para as pessoas, evitando óbitos. Isto porque uma resposta assistencial efetiva e oportuna previne mortes e agravamentos evitáveis”, avalia Prosdocimi.
Ação
Ao menor sinal da doença, é necessário procurar uma Unidade Básica de Saúde.
A caixa de restaurante Júlia Gonçalves, de 19 anos, começou a sentir dores no corpo e dor de cabeça na sexta-feira (15/3). Grávida, ela não teve dúvida de que deveria procurar um médico na Unidade Básica de Saúde (UBS) do bairro São Pedro em Belo Horizonte, onde mora.
Assim que chegou à UBS, foi avaliada pelas técnicas de enfermagem e encaminhada para consulta médica com suspeita de dengue. Sentindo-se fraca e indisposta, a gestante está sendo monitorada pelos profissionais da unidade. “Como estou grávida, pediram para que eu viesse ao posto todos os dias para ser monitorada”, conta.
A médica Mônica Aparecida Bruno relata que durante a semana tem atendido um grande volume de casos de arboviroses na unidade. “Estamos tendo muitos casos por dia. O atendimento é feito pela auxiliar, que faz uma primeira escuta e, em seguida, agenda para a avaliação médica. Acompanhamos durante todo o período agudo até a fase em que o paciente melhora”, explica.
Dia D
A SES-MG, por meio das 28 Unidades Regionais de Saúde, está coordenando um novo Dia D em todo o estado. O evento, que integra o movimento “Minas Unida no Combate ao Mosquito”, será realizado no dia 23/3.
Estão planejados mutirões comunitários para eliminar os focos de Aedes aegypti, além de ações de mobilização para orientar e conscientizar a população que a responsabilidade diária de manter ambientes dentro das casas é também do cidadão.
Em parceria com a Secretaria de Estado de Educação (SEE-MG), também estão sendo realizadas, de 18 a 23/3 ações de mobilização nas escolas, no âmbito do Programa Saúde nas Escolas, com o uso de cartilhas e atividades lúdicas, como caderno de colorir, jogo da memória e caça-palavras.
Cerca de 540 municípios já aderiram, em uma ação integrada entre Governo Estadual e as Secretarias Municipais de Saúde. As prefeituras que ainda não fazem parte do movimento podem procurar a Unidade Regional de Saúde da qual fazem parte.
O primeiro evento teve a adesão de 546 municípios mineiros. A programação incluiu blitz educativas, passeatas, atividades lúdicas em escolas e em locais com grande circulação de pessoas, entrega de material informativo, palestras e rodas de conversas.
A mobilização contou, ainda, com visitas às casas para orientar e conscientizar os moradores sobre a responsabilidade diária de combater a dengue, zika e chikungunya.
Mais informações em www.saude.mg.gov.br/aedes.